Em pauta: o aumento de vendas do Rivotril (Clonazepam), remédio usado para combater a ansiedade que entrou para a lista do segundo mais vendido do país. Para sanar dúvidas sobre o uso correto desse medicamento, a equipe de web jornalismo do Portal Minas Saúde conversou com exclusividade com a Dra Sandra Carvalhais, médica psquiatrica formada pela UFMG e presidente da Associação Mineira de Psquiatria.
Acompanhe:
Principais dúvidas da Bula do Rivotril (clonazepam)
Portal Minas Saúde – O Rivotril (clonazepam) está no mercado brasileiro há 35 anos e é um dos calmantes mais conhecidos. Gostaria que a senhora explicasse para quais casos esse remédio é recomendado? Ele causa dependência?
Dra Sandra Carvalhais – O Clonazepan é um ansiolítico (medicamentos que diminuem a ansiedade) das substâncias do grupo dos benzodiazepínicos cuja principal indicação é a ansiedade, nas diversas formas em que ela possa se apresentar (angústia, ansiedade generalizada, ataques de pânico, fobias, etc).
Todos os medicamentos desse grupo podem causar dependência (por isso são de “tarja preta”), e o seu uso deve ser limitado, devendo ser descontinuado assim que a ansiedade estiver sob controle. As substâncias que causam dependência podem levar à síndrome de abstinência se interrompido de forma abrupta, por isso, na descontinuação do medicamento deve-se diminuir gradualmente a dose.
Todo medicamento tem uma dose diária adequada. A posologia de clonazepam deve ser individualmente determinada, de acordo com a resposta clínica e a tolerância (sobretudo em relação à sedação) de cada paciente. Deve-se iniciar com doses mais baixas (0,25 a 0,5 mg ao dia) e aumentá-la gradativamente, até atingir a dose em que o paciente apresenta redução dos sintomas suficiente para retomar suas atividades diárias de forma adequada. A dose máxima diária não deve exceder 4 mg, sendo que as doses noturnas devem ser maiores que as doses diurnas.
Portal Minas Saúde – Mesmo sendo um remédio de tarja preta, o Rivotril supera a venda de remédios ditos como de uso corriqueiro como hipogloss e tylenol. Será que as farmácias estão mais “liberais” para a venda desse remédio ou o brasileiro creditou o ansiolítico como uma “nova solução” para os problemas?
Dra Sandra Carvalhais – Além de serem indicados para os sintomas de ansiedade existem outras indicações para os benzodiazepínicos: na epilepsia, geralmente associado com outros anticonvulsivantes (geralmente em doses bem maiores do que as doses usadas para ansiedade); para relaxamento muscular, sedação e tratamento da insônia.
São muitas as situações que causam insônia que deve ser tratada porque essa influi muito na qualidade de vida das pessoas e pode contribuir para o agravamento de outros quadros clínicos. Também são indicados em situações que causam ansiedade, mas que não caracterizam um transtorno de ansiedade: pré e pós-operatório, doenças cardiovasculares e doenças crônicas com consequentes tratamentos prolongados. Como são muitas as situações em que o clonazepam pode ser utilizado, deve-se esperar que seja um medicamento muito vendido, e isso ocorre não apenas no Brasil.
Esse medicamento só pode ser comprado com a apresentação da receita médica e da “notificação de receita B”, que fica retida na farmácia, para controle dos órgãos competentes. Dito isso, fica claro que as farmácias não podem ser “liberais”, esse é um ato errado, sujeito a sanções. No entanto, frequentemente vemos relatos de pessoas que compram medicamentos controlados sem a devida apresentação de receita.
Para cada caso que aparece quantos são os que ficam encobertos? Podemos imaginar que são muitos. Mas isso também não significa que as farmácias estão ficando “liberais” mas que existem pessoas desonestas nesse ramo de comércio como em todos os segmentos da sociedade, não podemos generalizar.
É sabido que a sociedade atual valoriza a busca do prazer, portanto, o desprazer é evitado a todo custo. Nessa forma de raciocínio, é muito frequente que pessoas busquem o uso dos ansiolíticos como a busca de “uma nova solução para os problemas”, melhor dizendo para o sofrimento emocional que os problemas podem provocar.
Assim, diante de uma perda que causa angústia, como não poderia ser de outro modo, ao se lidar com essa angústia, com a inevitável tristeza diante da situação, muitas pessoas buscam o remédio como “amortecedor” (amortece a dor?), como se isso fosse possível. Os especialistas alertam para o perigo de se desenvolver uma dependência a partir desse uso, exatamente porque o medicamento dá uma sensação de bem-estar, artificial diante da situação.
Portal Minas Saúde – Quais são as possíveis complicações para uma pessoa que usa este medicamento sem prescrição médica?
Dra Sandra Carvalhais – Um risco importante é a dependência. O uso desse medicamento exige acompanhamento médico. Esse, ao perceber sinais de início de dependência (um dos primeiros sinais é a necessidade de aumentar a dose do medicamento para obter o efeito que anteriormente se obtinha com uma dose menor) vai tomar medidas, como substituir esse medicamento por outro, de forma adequada (diminuição gradativa da dose de um medicamento e aumento gradativo da dose do que está sendo introduzido). Outro risco importante é o comprometimento da memória, o que também exige a substituição do medicamento.
Portal Minas Saúde – A grande venda de rivotrill pode indicar que o brasileiro ainda tem o péssimo hábito da automedicação? Ou ainda um certo preconceito de procurar uma ajuda psiquiátrica ou psicológica?
Dra Sandra Carvalhais – É difícil avaliar a porcentagem que a automedicação representa no número total da venda do clonazepam. Como é uma venda ilegal, não deixa registros, mas é sabido que a automedicação é um hábito comum para muitas pessoas. Nem sempre a automedicação se associa com o preconceito em relação aos sintomas psiquiátricos, essa é frequente com vários tipos de medicamentos, inclusive os de venda livre.
Aliás, os psiquiatras clínicos percebem que o preconceito em relação às doenças mentais diminuíram nas últimas décadas, é muito maior o número de pessoas que reconhecem quando apresentam problemas psiquiátricos e buscam o tratamento. Claro que ainda existe o estigma que precisa e deve ser combatido.
Ficou ainda alguma dúvida sobre o medicamento? Deixe nos comentários ou procure seu médico.
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